O texto de Renaud Laby afirma o seguinte:
“Os gigantes digitais inscreveram a semelhança social nas estruturas técnicas da máquina para manter o usuário da web online o maior tempo possível para que ele deposite o máximo de dados. Relacionámo-nos, de facto, mais livremente e por mais tempo com aqueles que se parecem connosco. Essa massa de informações rentabilizadas é o combustível, o ouro negro do século XXI. Essa é a economia da web! Graças ao modelo de captação de dados, os grupos que fornecem os serviços mais utilizados online encontram-se no coração da rede e erguem-se em monopólios. GAFAM (Google, Amazon, Facebook, Apple e Microsoft), mas também NATU (Netflix, Airbnb, Tesla e Uber) são os paradigmáticos.”
Segundo o autor mencionado em cima, que é um padre católico, estudioso dos media e, sobretudo, dos media utilizados pela Igreja católica, a ‘ferramenta’ da internet passou por várias fórmulas de cálculo, parâmetros, de forma a medir, a avaliar, a propor e a induzir. O primeiro parâmetro foi a ‘medida de audiência’ que avaliava a popularidade por meio da contagem de clics; depois, veio a ‘medida da reputação’ que avaliava pela contagem de likes e tweets; hoje, diz R. Laby estamos num
novo paradigma, a que chama a ‘medida preditiva do comportamento’.
Com a designação ‘medida preditiva do comportamento’, o autor descreve aquilo que hoje todos sentimos, a internet parece conhecer-nos, aos nossos gostos, comportamentos, e vem ao nosso encontro com aquilo de que precisamos. De facto, os traços de comportamento que deixamos em linha - clics, likes, visualização, navegação, localização -, são calculados para probabilizar, recomendar, propor… E assim ficamos mais focados nos nossos interesses e mais tempo nas plataformas.
Isto não é novo, e conhecemos o que está a acontecer. Mas será que traz alguma alteração na recomposição da sociedade e alguma mudança na nossa antropologia? A resposta é afirmativa. Na verdade, ‘as operações informáticas afectam as nossas estratégias cognitivas de pensamento’, na medida em que cada um de nós, na sua singularidade, procura entidades e realidades mais parecidas consigo. Assim, a internet traz-nos
- um mundo mais horizontal, sem instituições de poder ou sequer intermediários, em que tudo, ao estar em pé de igualdade, será hierarquizado segundo a nossa própria escala de valores;
- um mundo mais segmentado, sem percepção da globalidade de pessoas, pensamentos e culturas, que será standardizado de acordo com o próprio interesse;
- um mundo mais agregado num colectivo, numa associação, sem centro, de acordo com a forma de apreciação.
Para o autor, está nova realidade de recomposição da sociedade e do indivíduo, é um novo realismo, um ‘metarealismo’, em que se alterou a
- a relação com o saber - todas as informações estão disponíveis (mas não existe a capacidade de fazer conexões ou investigação, ou dar significação);
- a relação com a verdade - todas as notícias podem ser verdadeiras ( tudo aquilo que se encontra na internet, na ‘hyperesfera’’, é acreditado, mais que noutras fontes);
- a relação com o tempo - tudo é instantâneo (propor processos faseados, processos de aprendizagem, processos de reflexão é um enorme desafio);
- a relacionámo-nos a autoridade - todos os centros de associação não têm um centro comum ( não existe um princípio de referência central; quem tem o poder já não é o responsável político, económico, científico, ou religioso, mas quem tem popularidade, quem cria ‘followers’).
A máxima “medium is message” de Marshall McLuhan, com a qual o autor pretende afirmar que o instrumento acaba torna-se mais performativo e transformador do que a própria mensagem, faz todo o sentido.
Se o alfabeto, que é uma sucessão linear de letras, palavras e frases, transformou o nosso pensamento nómada num pensamento discursivo, semântico e linear; se a mecânica tipográfica moldou-o num pensamento mecânico, analítico e objectivo… muito mais os utensílios da hyperesfera mudarão a nossa estrutura de pensamento, de coexistência e de visão do mundo.
( em formulação)
Sem comentários:
Enviar um comentário