II. Muito para além de Adap's, precisamos de 'evangelizadores' com 'carta de missão'. Muito para além de 'conselhos pastorais' precisamos de verdadeiras 'equipas de animação missionária'
Um dos maiores desafios de uma Diocese - e de uma Paróquia - será sempre o desafio da evangelização, ou o de tornar-se uma Diocese e uma Paróquia missionárias. Sucede, porém, que a missão da Igreja e a evangelização têm estado muito dependentes da liturgia - e não da palavra - ou seja, têm estado muito dependentes da garantia da missa, dos sacramentos e dos atos de piedade, em todas as localidades. Uma missão evangelizadora que se autolimite nesta dimensão acabará por concentrar-se numa única pessoa - no ministro ordenado - que não conseguirá chegar a todo o lado. É o que tem acontecido num 'paradigma de manutenção de horários de missa'.
Procurei dizer, no artigo anterior, que a valorização do Domingo e o empenho de todos na celebração festiva da Eucaristia não são apenas importantes mas prioritários. Mas há mais missão que nasce de uma missa e também há mais missão que converge para uma missa. Numa Diocese - e nalgumas Paróquias mais ou menos rurais - como são boa parte das nossas - há aldeias, lugares e casais, que podem convergir para a mesma missa sem que isso signifique o abandono das suas igrejas, capelas ou oratórios; da mesma forma, da mesma missa pode advir uma maior missão para esses lugares. Precisaremos, por isso, de evangelizadores, de missionários, nos próprios lugares, ou então enviados para esses lugares.
O ministério de catequista recentemente reinstaurado pelo papa Francisco pode muito bem ajudar a garantir e a enviar missionários por todo o território, que não o mantenham apenas, mas o 'missionem', o encontrem, o convidem. No que respeita este ponto, noto que em todo o território francês, em 2012, cerca de 9.500 leigos eram portadores de uma "carta de missão" (lettre de mission) escrita pelo bispo diocesano que nomeava certos cristãos para determinadas missões eclesiais. Pode, na verdade, haver mais missão de visita e de convite, num pequeno lugar, feito por um evangelizador que não precisa necessariamente de ser um animador de 'Assembleia dominical na ausência de presbítero'. Há mais missão para além das celebrações da palavra.
É também precisa uma equipa de missionários numa paróquia. Um padre não pode visitar sozinho todas as aldeias e todos os lugares, da mesma forma que não pode preparar sozinho a celebração do Domingo sem uma verdadeira equipa missionária. Às vezes os nossos conselhos pastorais são um belo grupo de preparação de uma festa, de uma procissão ou de uma angariação de fundos, mas não significa que seja um belo grupo missionário. Hoje precisamos muito de uma equipa missionaria que não seja apenas o coletivo das representações dos grupos e dos movimentos paroquiais, mas que seja um grupo que partilhe a mesma urgência missionária, a mesma visão missionária e a mesma convergência dos meios disponíveis.
James Mallon, a este propósito, fala dos quatro pilares de constituição de uma equipa missionária. É preciso Unidade de visão, Equilíbrio de forças, Vulnerabilidade e confiança e Tensão saudável. Quer dizer, é necessário um grupo que tenha o mesmo alinhamento de visão, cujas pessoas estejam no seu carisma próprio, numa autêntica relação de fé, caridade e perdão, e na transparência da sua intenção. No fundo precisamos de equipas compostas por pessoas credíveis, disponíveis, contagiantes e dóceis ('ductíveis'), que compreendam que a Igreja serve para anunciar Cristo.
I. Empregar 80% do tempo pastoral para encontrar 80% da comunidade dos irmãos. Da clássica regra 20/80 para a regra de ouro 80/80.
A Diocese de Santarém fará, em Julho de 2025, cinquenta anos da sua criação. A celebração do cinquentenário vai coincidir com o tradicional jubileu da Encarnação. Parece-me uma ocasião propícia para a ação de graças, a reflexão, a purificação e a projeção. Seria importante marcarmos a data com uma revisão de vida, mais do que com eventos físicos, ainda que eles sejam necessários.
Nesta ocasião, e também porque se aproxima uma nova nomeação pastoral, voltei a consultar James Mallon, Renovação Divina, Paulus, 2019. O livro foi publicado em 2014, e foi sendo aprofundado noutro, entretanto traduzido como J. Mallon, Desbloqueia a tua paróquia, Paulus, 2020. Há um outro sobre a renovação da diocese - Beyond the parish, de 2019 (Au-delà de la paroisse, de 2022) - que ainda não está traduzido em português.
No primeiro livro, Renovação Divina, J. Mallon aponta 10 prioridades para a renovação de uma paróquia (p. 270-271). As primeiras quatro são:
1. Dar prioridade ao fim de semana
2. Hospitalidade
3. Música edificante
4. Homilias fabulosas
(…)
As dez prioridades contrapõem-se aos sete valores reais por que se pautam as nossas actuais paróquias:
1. Preservação dos edifício
2. Catequese centrada nas crianças
3. Conveniência de horários
4. Expectativas mínimas
(…)
Sucede que as quatro primeiras prioridades estão centradas à volta do fim de semana (p. 95-101). O fim de semana - aponta o conhecido autor - é o único momento em que vemos 80% das pessoas da comunidade e, apesar disso, investimos apenas 20% do tempo pastoral a planear e a preparar esse encontro.
Na verdade, é fácil gastar 80% da semana em assuntos que não têm que ver com o fim de semana, tais como cartório, administração, reuniões, grupos, exéquias, etc. Planeamos e preparamos a semana como se nela acontecessem as coisas verdadeiramente importantes, e descuramos o fim de semana como se ele fosse ‘um acréscimo, um leve interromper do trabalho real, que decorre de segunda a sexta’ (p. 96).
Não há dúvida de que a prioridade de qualquer paróquia e de qualquer sacerdote deveria ser o fim de semana, a celebração da eucaristia e o encontro da grande comunidade. É preciso ultrapassar a ‘clássica regra dos 80/20’ como diz Mallon, para uma outra regra de ouro 80/80: 80% do tempo semanal para planear e preparar o encontro com 80% da minha comunidade, em vez dos habituais 20% empregados para encontrar 80% da nossa comunidade.
Na verdade, é fácil verificar como descuramos o domingo. Basta ver as celebrações seguidas umas das outras, sem tempo de qualidade para desenvolver relações e realizar convites, para encontrar ou juntar as pessoas; sem um ministério de música que motive e faça sentido, sem acólitos, sem famílias, etc. Assim, de repente, não podemos celebrar mais de duas eucaristias no domingo de manhã, às 10.30 e às 12.00 (uma outra às 16.00). Deveríamos arrumar assim o domingo para estarmos uns com os outros com comunhão e alegria.
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